quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Pai...

Pai...como olhas o nosso rio agora?
Ainda há malmequeres a alegrar o verde das ervas?
E as mimosas que chegam no Carnaval...ainda continuam a inundar
[de perfume a nossa aldeia?
Sei que estás triste.
Queria tanto que acreditasses que é possível ser feliz e ser
[velhinho...
A doença, só não se cura se for doença de alma!
Do meu coração para o teu...
Olha aqui a minha mão para te amparar no abismo da tristeza que
[sentes e te esforças por esconder.
Olha aqui o meu abraço que te abraça por inteiro para não
[precisares de bengala.
Do meu coração para o teu...
É inevitável que também te relembre jovem e eu menina de tranças.
Lembro os passeios, os risos, as guerras e os abraços...
Os abraços que quase nunca davas mas que estavam nos teus olhos.
Lembro o caminhar na noite...os pedregulhos das ruas escuras da
[aldeia...e a minha mão pequenina na tua mão e o meu olhar pendurado na tua voz "..Levanta bem os pés, dá passos altos de gigante, assim não cais".

E eu não caía.
Na noite da vida, caí de tempos a tempos...mas foi só porque estava
[a aprender a caminhar na Vida. E a vida é maior que uma aldeia.
Caí. Mas, dando "passos altos de gigante", sabia que a tua mão
[estava lá no escurinho para me agarrar, quando necessário.
Senta-te aqui, pai.
Hoje é um dia escurinho para ti.
Hoje sou eu que te dou colo.
Adormece tranquilo...eu canto-te em silêncio uma canção de embalar
[e amanhecer.
Vais ver que amanhã vai estar sol.
Vais ver que amanhã o brilho dos olhos que me emprestaste, vai
[para ti também.
Do meu coração para o teu...acredita em mim.


NIA, Caderno nº 24

Sem comentários: