Amanhã serei hoje
Olhar-me-ei com toda a vaidade
Como há muito tempo o meu Pai
sob os cartazes e o vidro das grandes esplanadas
ou o meu Avô no cromado das grandes barbearias
à medida que um vulto achado no meu espelho
me lembrar de dormir escondendo as olheiras
velando através dos meus dias
Mudarei assim pelas rotas do Brasil uma manhã
debruçado entre as linhas inequívocas duma casa
[enraizada de pássaros
como os homens de Luís Fernandes em 1502
entrados perdidos com uma nau dez léguas para
[fora
do mundo conhecido numa grande foz –
naufrágio de chegar exactamente ao nada
[meridional
de cavalos-marinhos fazendo soçobrar
um batel de mareantes pela primeira vez
à sombra do quadrante em Delagoa-Bay
Assim irei adormecer quebrar o selo que sinto
ao me ver pela vigília do Tempo
a prolongar os jardins suspensos num terraço
conversando à luz contigo
a trautear as sonatas diluídas para os órgãos de
[Água do ar
Me vejo água-marinha sobre um pano negro de
[areias múltiplas
me arquear desígnio da reta destemida do fragor
[duma sílaba
num oceano transbordante de transfiguração
dissolvendo numa espiral efervescente
a superfície marcada pela solidão mais íntima
distribuída por algumas vozes submersas
rentes sobre os muros de atlântica esperança:
de canção cujo Eco
as sereias devolve
Amanhã serei hoje
António José Coutinho, Caderno nº 28
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário